domingo, 28 de julho de 2013

Jorgin & Manuelino

Tudo ia bem na bucólica Albertina,cidadezinha do interior,com a vida pacata de seus habitantes, quando apareceu por lá, Jorgin, um desses andarilhos de estrada, esfarrapado, sem eira nem beira,que resolveu dar uma paradinha em sua vida errante, estabelecendo-se debaixo da ponte do Rio Turvado, que cortava a cidade bem ao meio. Jorgin saia pelas ruas perambulando, a esmolar , apelando a caridade publica, por um pedaço de pão ou uma roupa surrada...as vezes davam-lhe moedinhas,que juntando-as dava para comprar uma garrafa da maldita branquinha, água que passarinho não bebe, mas que aquece as madrugadas frias.
Uns achavam-no um coitado, outros ainda nem tomavam conhecimento de sua existência por lá, mas tinha os que incomodavam-se com ele e enxotavam o vagabundo, que detestava a ideia de trabalhar, só de pensar nisso já arrepiava-se todo,gostava mesmo era de viver solto,sem regras,etc...
Como sabem, as cidadezinhas do interior,possuem sempre uns personagens, assim excêntricos, quase folclóricos,que dominam a cena, um pouco doidos, conhecidos por todos...em Albertina não era diferente.
Manuelino um homem de uns quarenta e tantos, desde sempre encarnou o guarda noturno da cidade,andava de uniforme caqui, herança do avô que tinha sido soldado constitucionalista em 32,uma lanterna de pilhas e um apito, ganho de um juiz de futebol,que por lá passara algum dia. A noite era dele,punha ordem em tudo e em todos...os namorados, que atras da matriz trocavam juras de amor, nada convencionais que o digam, ninguém o contrariava, faziam de conta e pronto.Uma noite destas resolveu inspecionar debaixo da ponte e tomar satisfações do tal do Jorgin, que já meio bêbado dormitava, com um olho aberto e o outro fechado,   e de pronto, iluminando a cara do dito cujo com sua lanterna, foi logo gritando e dando ordens explicitas para que sumisse da cidade, ao que Jorgin num impeto de fúria atacou Manuelino com uma pedrada na cabeça e empurrou-o rio abaixo,e o afogou nas águas turvas e voltou tranquilo, pro seu cantinho, esperando que a correnteza levasse rio abaixo o corpo do infeliz para bem longe dali.
Desaparecido Manuelino,a cidade inteira deu por sua falta e logo a noticia correu de boca em boca e começaram a procura dele por toda a parte, até que dois dias depois seu corpo de afogado e ferido, fora encontrado por um pescador, entalado numa curva do rio. Ninguém em Albertina teve dúvidas, de quem teria sido o autor do assassinato, só poderia ser o vagabundo da ponte, e assim foi o delegado e dois praças para lá e prenderam Jorgin, que não negou a autoria do acontecido, mudando-se agora para a cadeia local.
Aberto o inquérito e caracterizado o homicídio qualificado correu processo no forun local.
A vida para Jorgin tinha melhorado sobremaneira,cafe da manhã, quentinha no almoço e jantar, alem das regalias de um teto,cama e banho...para quem debaixo da ponte tiritava de frio a noite estava bom agora, só sentia saudades da branquinha,nada é perfeito!Sr Delegado,até arrumara terno, gravata e sapatos, para que Jorgin ao apresentar-se ao Juiz convenientemente vestido.
A morte trágica de Manuelino, muito querido que era,  revoltou a população e dividiu as opiniões, com aproximação do julgamento, uns achavam que o réu deveria pegar trinta anos e morrer na prisão, outros achavam o contrario que deveria ser liberto para voltar a passar fome e frio e ser expulso da cidade.
Chegado o grande dia do julgamento,o povo todo ouriçado lotou o plenario do Forun para assistir, tudo preparado,advogados de acusação e defesa,jurados,testemunhas, entrou o Juiz de toga e martelo, pediu silencio e que se apresentasse o réu.
Surpresa geral,entra o delegado, que deveria ter conduzido Jorgin da cadeia para o banco dos réus e comunica ao Juiz diante de todos:Jorgin esta morto,fora picado por uma cascavel durante a noite!




terça-feira, 23 de julho de 2013

O Acidente Duplo

Alto verão, manhã quente,periferia de São Paulo, e o Edimilson, peão migrante, do nordeste, caminha pela calçada , subindo a Av. Baronesa de Cocais , rumo ao seu barraco, logo acima...absorto em suas lembranças, quando um caminhão do depósito de materiais, numa manobra de ré, atropelou o Edimilson, que com o golpe recebido caiu desacordado ao chão duro do asfalto quente, transeuntes que por ali passavam socorreram o acidentado, mas desconfiaram que de nada valeria, pois aparentemente já estava morto.
Acionada a policia, foram feitos os procedimentos de praxe, e constatada a morte , os policiais acionaram a presença da Policia Cientifica e a remoção do corpo pelo Serviço Funerário.
Enquanto isso o povo foi rodeando o corpo do rapaz, alguém providenciou jornais para cobri-lo e amenizar a exposição do corpo. O transito no local ,ficou um caos, todos os carros paravam para verem o acontecido. A policia montou guarda para preservação da cena e do corpo do pobre Edimilson, que quando vivo nunca mereceu atenção devida, sem parentes ou amigos, agora era alvo do publico, pois curiosidade mata!
Passaram-se horas e a Policia Cientifica não chegava para documentar o acontecido, o corpo continuava ali, o sol do meio dia era escaldante, torrava as cabeças das pessoas e fumegava no asfalto.
Lá pelas tantas aparece uma velhinha que piedosamente acende uma vela para o defunto, o policial estressado que montava guarda fica meio preocupado, mas respeita. Nisso aparece um moleque estabanado que querendo ajudar, tropeça e derruba a vela acesa, nisto os jornais que cobriam o corpo,rapidamente pegam fogo, queimando o morto, que num sobressalto dá um pulo e levanta-se.
O povão ao ver a cena grita, o policial de prontidão saca da arma e dá um tiro na perna do Edimilson que cai sangrando...mais gritos do povo!
O rabecão da funerária que ali estacionado aguardava para levar o defunto para o necrotério, muda o destino levando as pressas o Edimilson para o hospital.
Assim terminou o dia do nosso herói. Que azar, mas que sorte!

domingo, 21 de julho de 2013

O Padre Sumiu

No domingo, já tarde da noite, terminada a quermesse, da festa junina paroquial, que  tinha sido um sucesso, com muita gente,musica,barraquinhas,e o tradicional churrasco,Padre José,um tanto cansado,despediu-se do sacristão e foi recolher-se na casa paroquial,sem antes lembrar-lhe,de seus cachorros.
No dia seguinte,o sacristão abriu pontualmente a igreja e badalou os sinos,enquanto alguns fieis vieram para a missa da segunda feira,tradicionalmente dedicada as almas e passada meia hora do horário, o Padre José não aparecera para a celebração e os fieis já inquietos com a demora acionaram o sacristão que andava de um lado a outro inquieto,e que por sua vez mandou o coroinha até a casa do vigário para saber o que havia acontecido.O moleque foi num pé e voltou no outro com a noticia de que o padre e nem seu carro, um velho corcel azul, estavam lá.
Pronto, a noticia espalhou-se rápido,o Padre José sumiu.Onde estaria?Fora sequestrado?Vitima de ladrões?
Foram logo avisando a policia,que registrou o desaparecimento e deu inicio as buscas pelos arredores e nada.Acionaram o Bispo e em sua presença o delegado arrombou a porta da casa paroquial, onde nada fora mexido e nem sinal do padre.Nem vivo,nem morto!
Procuram daqui e procuram dali, três dias depois,acharam o carro do Padre Jose no estacionamento da rodoviária local,e do qual exalava um cheiro forte de putrefação vindo do porta malas.Dado o alarme pela policia,o povo tomou conta do local,todos queriam ver,curiosidade mata!
Chegando o delegado o porta malas foi aberto na presença de todos e qual não foi a surpresa,não havia corpo nenhum,mas sim um saco plástico cheio de ossos e restos de carne do churrasco de domingo que o sacristão havia posto ali para os cachorros do padre.
O mistério continuava, onde estaria o vigário?
Todos perguntavam e queriam saber...passaram-se seis dias do desaparecimento, e nada do Padre Jose,nem noticia boa e nem ruim, simplesmente sumiu!
-Teria largado a batina? Especulam as devotas.
-Mas o carro não saíra da cidade! Afirmavam os detetives de plantão.
No domingo seguinte,seis horas da manhã,chega na  rodoviária o ônibus noturno,vindo do norte de Minas e Padre Jose apressado desembarca e vai a procura de seu velho corcel azul que havia deixado estacionado, não o achando, decidiu por um táxi,pois queria chegar a tempo para a missa dominical das sete horas da manhã.Aos fieis, na hora do sermão, justificou-se: viajei as pressas, para a casa de minha mãe,em Minas,que em agonia aguardava-me para partir deste mundo! Deus a tenha!


sexta-feira, 19 de julho de 2013

O BIGODE

Desde a adolescência , vivida lá pelos anos sessenta, Antônio barbeava-se religiosamente a cada três dias, extraindo toda penugem dos anos verdes até os pelos mais consistentes da maturidade, seguindo a regra: cara limpa, lisinha.
Perto de completar anos, recebeu de um amigo querido,um pedido inusitado:
-Deixe crescer a barba e o bigode.
A principio Antônio não gostou muito da ideia, mas como amigo a gente não decepciona nunca, lá foi deixando de barbear-se, barba e bigode cresceram rápido, tomando volume...uma semana, um mês e nosso herói mirava-se no espelho e não apreciava muito o que via, envelhecera muito com aquela barba branca, começava a parecer papai noel, mas estava gostando do bigode, ai teve uma ideia, passou uma máquina zero em tudo que ainda restava de cabelo e barba, deixando apenas o cavanhaque e bigode brancos. Foi mantendo o visual, mas o tal do bigode e o cavanhaque foram crescendo rápido, encorparam-se, imensos dando  para enrolar em cachinhos... Antônio começou a preocupar-se, precisava dar um jeito naquilo, mas tinha medo de por tudo a perder, foi deixando crescer, os lábios desapareceram, a sopa noturna sobrava caudalosamente nos cantos da boca, o café com leite matinal tingiam o esbranquiçado...corria lavar, secar, pentear e nada!Uma voz interior lhe dizia:
-Antônio você precisa tomar uma providencia urgente: ou trata bem deste bigode e cavanhaque ou desiste e navalha tudo!
Nestas horas, sempre aparece alguém para ajudar, um colega de trabalho, vendo o desespero do companheiro aconselhou:
-Procura o Heitor, ele vai dar um jeito nisso!
E lá foi o Antônio procurar o Heitor, um ex-surfista, quarentão, todo proza. 
Expostas as angustias do paciente, ouvidas com atenção e examinado o caso, Heitor exclamou:
-Tenho a solução!
Armou-se de ferramental adequado e deu inicio a operação de salvar o bigode e o cavanhaque, ordenando ao nosso amigo, sente-se na cadeira,tire os óculos, mantenha a espinha ereta, a cabeça quieta e a boca fechada, pois a situação é delicada, qualquer vacilo pomos tudo a perder, mas antes fez uma pergunta:
-Serviço tradicional ou inovador?
Antônio de pronto respondeu, tradicional, pois o amigo lá do inicio da estória, que fizera o pedido, era de perfil conservador, assim meio germânico, um tanto inflexível, mas com muita prontidão!
Trinta minutos depois, Heitor pediu:
-Coloque os óculos e veja se ficou bom?
Antônio ao ver-se no espelho ficou aliviado, pois o resultado era melhor do que o esperado.
-Quanto lhe devo?
-Dez  reais, para ficar cliente.
-Até o mês que vem Heitor, obrigado!
Antônio saiu aliviado e foi para casa, feliz da vida, e ao chegar em sua garagem, deparou-se com seu vizinho, um caminhoneiro cinquentão, que após um cumprimento, exclamou expontaneamente:
-Seu Antônio, como o senhor ficou jovem!
Antônio corou-se todo, e rapidamente subiu as escadas, entrando em casa.